
by J. Berlange Andrade
O recente conflito entre o Presidente da República e o
Congresso Nacional, decorrente da revogação legislativa de um decreto
presidencial sobre o IOF, reacendeu debates cruciais sobre a atuação do Supremo
Tribunal Federal como mediador de crises institucionais. A decisão do ministro
relator Alexandre de Moraes de suspender ambos os atos normativos e convocar
audiência de conciliação foi vista por muitos como ingerência política, e mais:
ao suspender os efeitos do ato regulamentar do Executivo, teria se alinhado aos
objetivos político-eleitoreiros da oposição congressual. Contudo, à luz do
Código de Processo Civil de 2015 e da função constitucional do STF, tal postura
revela uma nova forma de jurisdição moderadora, ancorada na lógica do consenso
e da estabilidade institucional.
Na trilha iniciada por Mauro Cappelletti e replicada aqui
por Kazuo Watanabe, vejo apenas mais um resultado de avanço civilizatório: do
paradigma adversarial ao paradigma dialógico -
O CPC/2015 introduziu uma ruptura conceitual com o modelo processual
tradicional. A jurisdição deixou de ser entendida como puro exercício de
poder estatal e passou a integrar um sistema cooperativo
(art. 6º, CPC), com deveres mútuos de boa-fé e busca de solução consensual.
Embora o Código regule prioritariamente conflitos privados,
seus princípios informam a atuação judicial em todos os níveis,
incluindo a jurisdição administrativa e a constitucional.
Também não deve ser carimbado como ativismo judicial: é o
STF atuando como guardião do equilíbrio institucional - Historicamente, o
Supremo exerce função de “árbitro dos conflitos federativos”. Mas, no contexto
contemporâneo, onde a crise entre Poderes é muitas vezes de natureza
política e normativa, o STF passou a desempenhar uma função moderadora
ampliada: preservar a harmonia prevista no art. 2º da Constituição,
evitando rupturas no pacto republicano.
A suspensão cautelar dos atos conflitantes (decreto do
Executivo e decreto legislativo) pela via da cautela jurisdicional,
seguida de convocação para audiência de conciliação, não configura
ativismo — mas sim uma técnica de gestão processual orientada para a
descompressão do sistema institucional.
O Relator Moraes respondeu com sabedoria ao dilema entre
neutralidade e protagonismo - A crítica recorrente à Corte é de que ela
ultrapassa os limites da função jurisdicional, substituindo a política pela
técnica. No entanto, nos casos em que há colisão entre competências
constitucionais — como no caso do IOF — não há como aplicar a Constituição
sem operar uma escolha interpretativa.
A questão essencial passa a ser: o STF impôs uma solução?
Ou criou um espaço legítimo para a negociação entre os Poderes?
A audiência de conciliação, nesse contexto, não é decisão
judicial resolutiva e nem abstenção judicial. É medida técnico-ética de mediação
constitucional — um recurso para preservar a força normativa da Carta e
a confiança no pacto federativo (confiança abalada pelos maiores interessados, às vezes, motivados por impulsos
eleitoreiros absolutamente desconectados das expectativas da maioria do povo).
A modelagem que substitui o espaço de conflito pelo espaço de
consenso, está consolidado por precedente e institucionalização da prática
conciliatória - Nos últimos anos, o
STF já utilizou estratégias similares em conflitos federativos sobre ICMS; litígios
ambientais entre União e Estados e disputas sobre orçamento e partilha de
recursos. Tais precedentes mostram que a
composição processual pode (e deve) ser instrumento da jurisdição
constitucional, desde que respeitada a legalidade, a isonomia das partes e
o controle colegiado posterior.
Infelizmente, na
mídia hegemônica ainda alimenta a velha prática adversarial que dá movimento á política,
agora radicalizada pela manipulação da indignação de uns e do ódio de outros - A
crítica à “politização do Judiciário” não deve obscurecer o fato de que o
direito é, por natureza, um instrumento de contenção da política — e
que, em tempos de polarização radicalizada, a atuação judicial equilibrada e
dialógica pode ser a última barreira contra rupturas institucionais
graves.
O STF, ao aplicar os princípios do processo civil ao
processo constitucional, não está apenas julgando — está preservando o
próprio espaço do julgamento como instância legítima da República.
Os
brasileiros devem se orgulhar desta Corte Suprema que lhes entrega proteção e justiça
firmemente impregnada do apego à legalidade e à Constitucionalidade. Não são poucas as lideranças e as
ideologias políticas que estão vencendo a guerra que iniciaram para subjugar o
Judiciário de outros Países.
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