o cavaleiro encarnado do apocalipse tupiniquim





É fácil de entender porque tanta gente está apostando no Bolsonaro como promessa para resolver a insegurança que tomou de assalto a mente amedrontada do brasileiro comum,  honesto e bem-intencionado. Essa crença no uso das armas e das milícias, porém, não encontra respaldo na realidade. É uma fé permeada de preconceitos, fundada em informações precárias, passadas por um jornalismo de TV exageradamente denuncista e alarmista, mas distanciado e omisso quanto ao conteúdo do debate sobre crime e violência que é desenvolvido nas academias científicas e que aponta saída pela educação, tanto nos núcleos primários de sociabilização (família, religiões, comunidade) quanto no acesso ao conhecimento prático e teórico.

A fala de Bolsonaro é simplista, fácil de decodificar, mas sem operacionalidade – portanto, inútil, ineficaz ou até mesmo contraproducente. No sentido de obter resultado inverso: em vez de reduzir a violência, ampliá-la. A influência da fala simplista acaba produzindo influxo nefasto, porque a criatividade dos seguidores faz multiplicar leituras e soluções que não levam em conta a real complexidade do problema.
Recentemente, num comentário do Facebook, um bolsonarista apontava para uma imagem que estampava duas fotografias, cada uma mostrando diferente grupo de crianças e adolescentes empunhando armas, a primeira feita no jardim de uma casa de bairro da classe média alta (três juvenis, brancos, loiros e bem vestidos – armas pareciam de brinquedo); a segunda, feita numa laje de barraco de alguma favela (três juvenis, negros e pardos, bermuda, chinelo e sem camisa – armas pareciam reais). E, naquela atitude de precipitada arrogância, típica dos que pensam que sabem, arrematou: “Na primeira foto trata-se de defesa; na segunda trata-se de ataque, sem dó nem piedade. É fácil de entender, é só querer.”

Simples, assim, está definida a relação que opõe como inimigos pobres e ricos, eurocêntricos e afrodescendentes. Na mesma simplicidade, já está fixada, também, a relação mocinho e bandido da fita que mostrara a cinemática da guerra que se agiganta no imaginário dos que “estão sendo atacados, sem dó nem piedade”. 

Estão loucos para se armar de verdade para começar a guerra de 'legítima defesa'. Quase não aguentam esperar a vitória que Bolsonaro já festeja nas urnas do segundo turno.
Ali na caixinha de comentários, assumi a exposição de um contraponto julgando útil à reflexão dos que pensam resolver tudo pela via da força policial ou da violência das milícias, argumentando assim: 

As duas imagens retratam atitude de um ‘ensaio de defesa’.
O quadro da direita (cena periférica), é a ‘defesa do negócio’ que garante a sobrevivência: quando o estado põe uma atividade econômica fora da proteção legal (comércio de drogas declaradas ilícitas, por exemplo), a competição entre fornecedores para abastecer a demanda do consumo cai na esfera da selvageria: não há outra alternativa aos competidores senão recorrer à autodefesa – não há limite à liberdade e cada um deve reunir a força necessária para defender o ponto do negócio. É nesse estado de guerra que os concorrentes encontram a ‘competência’ para se fixar no mercado. Observar que os traficantes se armam para a guerra entre eles próprios, não contra o Estado ou contra a sociedade que o marginaliza (deixa fora da margem da legalidade). A sociedade desinformada por uma mídia aparelhada por gente autoritária, idealista e ignorante dos problemas reais, vai na conversa dos ‘tele apresentadores alarmistas’ e acaba pressionando as autoridades, que – mesmo não acreditando na eficácia desse trabalho – empurra os policiais da prevenção (PM) para o centro do conflito, gerando tensões entre os negociantes ‘marginalizados do sistema estatal’ e os ‘defensores dos incluídos nos benefícios da Civilizarão’. Nesta guerra só não há enxurrada de mortos do lado policial, porque há, tácito, um acordo de faz de contas: um lado entrega, de vez em quando uns babacas com o bagulho podre para o outro exibir para as câmaras da TV, e, etc. etc. etc, resolve-se tudo nos mais variados consensos. Resolve-se o faz-de-contas num jogo de ganha-ganha. Portanto, neste quadro não há inimigo da sociedade e nem há ameaça de ataque aos homens de bem... 

Quadro da esquerda: desde cedo os pais, medrosos e/ou fascistas, ensinam aos filhos ver os 'diferentes' como 'inimigos': a diversidade é perigosa, seja de 'raça', gênero, nacionalidade ou de religião. Por aqui, buscando-se um distanciamento da realidade (incômoda), acaba-se, quase sempre, entrando em guerras.

Aprendem a atacar primeiro, com base num imaginário, para rapidamente encontrar conforto e justificativa no conceito de legítima defesa preventiva. Daí julgarem que a arma, de fácil acesso apenas para o próprio grupo de privilegiados, é sempre instrumento de defesa. A arma de posse ilegal do outro grupo, sempre instrumento de ataque!

Enfim. A guerra real que infelicita o ambiente que circunda aos marginalizados vai acabar sendo importada para o ambiente que circunda o mundo amedrontado dos que estão sob a proteção do Estado. As milícias já estão barbarizando nos bairros das cidades, muita gente de classe média que não acredita nas instituições republicanas está disposta a se converter em justiceiro nazista e predador fascista. E não haverá risco de punição pelo sistema judiciário, se grupos 'inimigos', como indígenas, sem-teto e sem-terras forem definidos como 'terroristas' no Decreto que Temer prepara para o uso futuro de Bolsonaro.

Bolsonaro é o cavaleiro encarnado deste apocalipse!

PS: O depoimento do policial Martel Alexandre Del Colle, abaixo, escancara os bastidores da vida do policial. A realidade é chocante. Não deixar de ler antes de votar no segundo turno nesta eleição, sob pena de votar à cegas pensando que as sombras da caverna é a luz.


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