O fake escândalo que escondeu no oco da montanha uma pequena catita.
by José Berlange Andrade
A Folha de S. Paulo, empresa controlada por banqueiros e financistas – de posse de diálogos e mensagens obtidas ilegalmente do celular de um funcionário auxiliar do gabinete do ministro Alexandre de Moraes –, noticiou em tom de escândalo que este juiz do STF e do TSE praticou atos fora do rito (sic), incorrendo nas seguintes ilegalidades ou irregularidades:
1 - “Os diálogos revelam um fluxo fora do rito envolvendo o STF e o TSE. O setor de ‘combate a desinformação do Tribunal eleitoral’ foi utilizado como um ‘núcleo alternativo de investigação’ para ‘abastecer um inquérito do STF’ em assuntos relacionados ou não com a eleição de 2022.”
2 - “Em vários casos, os alvos de investigação eram escolhidos pelo ministro ou por seu juiz assessor.”
3 - “As conversas mostram também que os ‘relatórios eram ajustados quando não ficavam a contento do gabinete do STF’ e, em alguns episódios, ‘feitos sob medida para embasar uma ação pré-determinada’, como multa ou bloqueio de contas e redes sociais”.
A matéria-denúncia foi escrita por um jornalista norte-americano que passou a residir há algum tempo no Brasil. Isto pode ter influenciado o erro que cometeu ao interpretar os fatos pelo critério do ordenamento jurídico de seu país. Ou então a peça foi produzida para alavancar a sanha assassina da direita contra o heroísmo de Alexandre de Moraes e da justiça brasileira – eficaz com o obstáculo que ergueu para amassar o golpe que visava manter Bolsonaro brincando de governar o País.
De qualquer modo, a notícia visou alimentar o ódio necessário para continuar com a demolição do prestígio da Justiça brasileira, principalmente face ao STF.
Analisando, porém, a tal quebra de rito constata-se: da demolição do montanhoso escândalo restou apenas uma pequena catita, assustada com a insignificância da própria cauda.
Até hoje, depois de 3 dias de recorrência, nenhuma relevância foi publicada. A folha continua perdida na sua incapacidade de esclarecer os fatos que julga imorais ou ilegais.
O jornalista e os editorialistas não conseguem enxergar com clareza o fenômeno que analisam. Pecam por não saber fazer as adequadas distinções entre órgãos, agentes, atos e fatos, procedimentos, processos, ritos e instruções. Misturando alhos com bugalhos, a reportagem pariu um caos de denúncias esvaziadas. Isto nos obriga a penetrar nessa selva, tateando a trilha com lamparina à testa.
A primeira grande distinção divide as relações sociais em atividades do campo público e privado e, aqui, a matéria foi assertiva. Todas as denúncias partem do suposto que os fatos se deram no campo da Administração Pública onde impera o critério de interpretação das condutas pelo viés da legalidade. A conduta do agente público deve se pautar pelas regras que a autoriza e a legitima, pena de serem invalidadas pelo controle da Administração ou do Judiciário, e, nos casos de elevada gravidade, ser o praticante do ato punido com penas que graduam até a perda do cargo.
Os arquitetos do plano – cuja execução começa com a notícia da Folha - visam a anulação dos procedimentos e inquéritos para livrar Bolsonaro da prisão que se aproxima ameaçadoramente e, simultaneamente, o impeachment de Moraes. Vão dar com os burros n’água, mais uma vez empurrados pela ignorância ou pela má-fé manipuladora.
A esfera da Administração Pública é estruturalmente dividida em três poderes que se distinguem pelo tipo de função que exercem prevalentemente: Legislação, Administração e Jurisdição, mediante atos de vontade dos agentes políticos investidos em seus cargos. Prevalência da função significando que todos os órgãos públicos praticam concomitantemente essas três modalidades de atividade, mas, cada um assume uma das funções com especialidade relevante e as outras como secundárias.
O foco da reportagem se dá sobre o Poder Judiciário. Nesta esfera, somente os juízes (de piso e de tribunais superiores) recebem da Constituição poderes para praticar atos (vontade política), com exclusividade na jurisdição e em concorrência na legislação e na administração.
Ato é toda escolha manifestada na forma de decisão. Escolha complexa construída mediante atividade reflexiva, isto é, uso da racionalidade metódica que mensura antecedentes e consequentes como motivação e finalidade.
E o ato se distingue do fato pela circunstância de que aquele produz nascimento, modificação ou extinção de direitos mediante uma manifestação de vontade declarada e fundamentada. O fato pode ser um acontecimento natural que produz efeitos não intencionais ou uma ação humana material, ou intelectual não decisório (apenas informativo ou opinativo, ou seja produção ou manifestação fatos da administração que não causa afetação direta a direito ou interesse em jogo).
Os atos se classificam em três tipos: decisão, opinião e informação. Mais à frente essas diferenciações serão aplicadas ao caso. Na esfera da Administração pública, todo ato deve ser praticado dentro de ritos formais: procedimentos e processos. O vocábulo rito, na significação usada aqui, refere regras para a promoção das ações ou para a execução de atos e prática de instruções necessárias ao andamento das ações dentro dos processos.
É importante essa distinção para compreensão do que aconteceu dentro dos gabinetes do ministro do STF/TSE. O rito aponta para a série de fórmulas estabelecidas para realização de atos públicos e solenes (cerimônias, protocolos e formalidades rígidas). A instrução difere do rito porque são regras ou ordens emitidas por uma autoridade hierarquicamente superior: visam prescrever a maneira como se devem executar os serviços auxiliares que são afetos à competência da autoridade que pratica atos decisórios. Podem ser comunicação escrita ou oral com normas de ação, de execução de tarefas, ditadas aos funcionários para desempenho das funções descritas em lei ou regulamento.
O padrão chave dessa relação hierárquica é sempre o da legalidade: o funcionário subordinado tem o dever de recusar cumprimento a ordem ou instrução manifestamente ilegal.
Ritos e instruções ocorrem tanto no procedimento jurisdicional quanto no administrativo. E aqui está outra distinção muito importante. É exatamente aqui que a Folha começa a escorregar no abismo das ignorâncias.
Na comunicação entre dois auxiliares lotados em diferentes gabinetes do mesmo ministro Moraes (na posição de autoridade Administrativa e não jurisdicional) o que se pratica é um singelo fato administrativo. Inapropriado falar em rito quando se tem diante dos olhos uma instrução operacional, uma ordem informal do chefe para o subordinado. Se cumpriram a ordem, a obediência reforça a presunção de legalidade, moralidade e finalidade da instrução emitida pela autoridade, estabelecendo um fluxo de troca de mensagens entre gabinetes da mesma autoridade em casos que, pela apreciação das partes e das tipicidades e das condições contextuais de uma eleição, estão em relação de conexão processual administrativa.
Os fascistas tiveram a cara de pau de comparar a troca de informações entre auxiliares do ministro com o conluio entre o juiz e os procuradores da Lava jato, afirmando a semelhança dos fatos para tirar daí a mesma consequência jurídica: anular o processo do Bolsonaro e dos golpistas de 8 de janeiro. Nada a ver.
Ora, à época da troca das informações, o ministro Moraes acumulava a função de relator de Inquéritos em seu gabinete no STF com a função de presidente do TSE. Em ambas as situações ele estava chefiando atividades administrativas e, portanto, não presidindo processos jurisdicionais.
O inquérito, procedimento inquisitorial de natureza administrativa, tem lá os seus ritos. Mas, as solenidades e formalidades são restritas aos atos que podem afetar diretamente direitos e interesses legítimos das partes, com potencial de dano.
Tanto o delegado quanto o relator na presidência do Inquérito, para realizar os múltiplos e diversos atos do rito necessitam da colaboração de agentes auxiliares (escrivão, investigador, perito, etc), e do pessoal de apoio geral.
A relação com os auxiliares especializados se dá, em regra, mediante instrução formal e escrita. Mas, na maioria dos casos do dia a dia do gabinete, a instrução é oral, direta, para tarefas imediatas. Ao lado da legalidade do rito há sempre uma boa margem de discricionariedade na instrução do processo, regida a escolha pelos princípios da celeridade, da economia e eficácia visando otimizar o resultado buscado pelo ato da autoridade.
No processo jurisdicional para a resolução de conflitos de interesses qualificados pela livre resistência ou pela impositiva legalidade, o movimento da ação, transitando por fases rituais, rumo à sentença se dá por impulso dos atos praticados pelo juiz, pelos auxiliares e pelas partes.
O juiz que preside o processo é o agente a quem incumbe a prática dos atos decisórios. Os demais partícipes, praticam opinião ou informação. Os representantes de demandante e demandado (advogado, promotor de justiça, defensor público), cumprem função tipicamente lobista. Prestam informação fática e opinião jurídica visando influenciar as escolhas do juiz. Peritos, testemunhas, etc, ligados à produção de provas fornecem informações para a instrução do processo.
Os servidores da justiça lotados na administração do fórum ou no gabinete do juiz também podem prestar informação e emitir opinião, quando autorizados por lei ou regulamentos. Submetendo esta proposição aos parâmetros definidos pela legalidade:
A Lei Nº 11.416/06, em seu Art. 2º define o Quadro do Pessoal efetivo do Poder Judiciário, organizando as seguintes Carreiras: I - Analista Judiciário; II - Técnico Judiciário; III - Auxiliar Judiciário. Os cargos são estruturados de acordo com as seguintes áreas de atividade:
I - área judiciária, compreendendo os serviços realizados privativamente por bacharéis em Direito, abrangendo processamento de feitos, execução de mandados, análise e pesquisa de legislação, doutrina e jurisprudência nos vários ramos do Direito, bem como elaboração de pareceres jurídicos;
II - área de apoio especializado, compreendendo os serviços para a execução dos quais se exige dos titulares o devido registro no órgão fiscalizador do exercício da profissão ou o domínio de habilidades específicas, a critério da administração;
III - área apoio administrativo, compreendendo os serviços relacionados com recursos humanos, material e patrimônio, licitações e contratos, orçamento e finanças, controle interno e auditoria, segurança e transporte e outras atividades complementares de apoio administrativo.
Com esta pequena clareira de legalidade aberta na densa floresta que envolve o caso deste “escândalo”, a gente pode concluir reagindo à análise das 'ilegalidades' apontadas pela Folha:
1 – Diálogos entre assessores dos gabinetes do ministro trocando informações com sentido de orientar a elaboração de uma informação para instruir ato decisório do presidente do inquérito. Não se trata de rito de interação entre o STF e o TSE: é fluxo de informação entre casos conexos, ambos sob a jurisdição do mesmo juiz, transitando entre gabinetes de um único e mesmo juiz inquisitor. Portanto, um fato da administração da justiça. Fato que deve ser tratado como instrução administrativa oral (informal) e não como rito processual. Ordem verbal é informalidade facultada na execução de tarefas de produção material e intelectual que, por si, não produz nascimento, modificação ou extinção de direito (aptidão do ato administrativo).
2 - O Decreto-lei nº 3.689/41, na combinação dos artigos 5 e 6, obriga a autoridade com poder de polícia a agir de ofício: “Art. 6º - Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá: III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias.” Desobedecer a este mandamento implica o crime de prevaricação. O delegado e o relator de Inquérito não fazem escolha arbitrária e não selecionam pessoas aleatoriamente. Deve reagir a fatos ou a notícia de fatos que chegam ao seu conhecimento, devendo imediatamente instruir seus auxiliares para a coleta de todas as provas.
3 – É dever da autoridade administrativa o controle, a revisão, a fiscalização e a orientação para a boa execução dos serviços públicos auxiliares, logísticos e estratégicos para assegurar a consecução eficaz dos fins visados pelas decisões que pratica. A omissão a esses deveres implica transgressão por desídia, cuja pena vai da advertência à exoneração do cargo.
Como se vê, o escândalo é uma tentativa de desestabilizar a República produzindo fumaça sem fogo. Ou seja, munição ficta para liderança perversa manipular o ódio e outras paixões que mobilizam as massas do senso comum contra as instituições da República Democrática brasileira. Neste caso, os ministros e o próprio STF!
Vergonhoso o papel sujo que poderosos bilionários estrangeiros e brasileiros entregam para o venal jornalismo destes tempos de ruínas.
https://bit.ly/3YMgIYT
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