O Estado laico e Ensino religioso confessional no STF



O ensino religioso está autorizado e pode ser aplicado facultativamente nas escolas públicas de nível fundamental no Brasil (Art. 210, §1º, da Constituição Federal de 1988). 

De fato, vários estados e municípios incluíram a disciplina religiosa nas suas escolas, mesmo não havendo orientação unificadora do governo.

Alguns consideram necessária a orientação normativa porque há divergências sobre a abrangência e o alcance na norma do Art. 19, inciso I, da Carta, que afirma ser a nossa ordem jurídica configurada como estado laico.

O ensino religioso pode ser do tipo confessional - doutrina de uma determinada religião ministrada por membro da denominação? Ou deve ser não confessional - não vinculado a uma religião, mas transmitido por professor do quadro do estado, especializado no conteúdo ético, histórico, sociológico, deontológico, de fonte científica e universal?

A audiência pública promovida pelo relator min. Roberto Barroso evidenciou que esta alternativa divide a posição de segmentos religiosos entre si, e também face aos ateus. 

Há os que negam validade ao CF 210 que autorizou o ensino religioso no espaço público do Estado laico. E há os que negam legitimidade ao privilégio de religiões majoritárias fazerem proselitismo com o ensino de sua doutrina e prática na escola pública. 

É aí que está o cerne da questão. Parte dessa divergência foi levada pela PGR à decisão do STF.  Na centralidade do conflito foi colocado o conteúdo do Decreto 7107 do governo Lula que promulgou, em 2010, o acordo entre o Governo e a Santa Sé relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil.

Especificamente, o § 1º do Art. 11 desse ato normativo:

“A República Federativa do Brasil, em observância ao direito de liberdade religiosa, da diversidade cultural e da pluralidade confessional do País, respeita a importância do ensino religioso em vista da formação integral da pessoa. 

§1º. O ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação.

A ação judicial pediu a declaração de inconstitucionalidade deste dispositivo ao fundamento de que a previsão da possibilidade de ensino religioso confessional nas escolas públicas ultrapassa o limite estabelecido pelo princípio da laicidade do espaço público estatal.  

O relator Luiz Roberto Barroso, de formação cultural judaica, deu provimento ao pedido no sentido de afirmar que o estado secular não pode usar as escolas públicas para que uma ou outra religião específica use seus sacerdotes ou professores para ensinar a doutrina e a prática de sua religião, em aliança interconfessional ou com a exclusão de outras.

O ministro Alexandre de Moraes divergiu e votou pela improcedência do pedido afirmando que a escola pública está autorizada a instituir o ensino religioso confessional. 

A votação resultou num empate de 5 a 5. 
De formação cultural católica, a ministra Carmem Lúcia cometeu breve voto de minerva na presidência do ato e acompanhou o voto divergente de Alexandre de Moraes: o ensino religioso pode ser aplicado como experiência de vivência religiosa específica. 

Esta escolha diverge da posição assumida pela esmagadora maioria das entidades púbicas e privadas, seculares e religiosas que participaram da audiência pública que debateu o tema sob a coordenação do relator Luís Roberto Barroso. 

Ver PlayList aqui: Audiência pública - Ensino religioso nas escolas públicas   

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