JUSTIFICANDO-JUIZ FEDERAL DESMONTA SENTENÇA CONTRA LULA
Analisando o conteúdo da denúncia e o texto da sentença do Juiz Sérgio
Moro, o Dr. Juiz Luís Ferreira da Rocha demonstra que a inclusão do Presidente
Lula como principal participante do esquema de corrupção da Petrobras (medida que possibilitou o estabelecimento da
conexão hipotética entre esta trama de fatos, dita corrupção ativa, e aqueles
outros eventos tipificados como corrupção passiva – circunstância que autorizou
a remessa do caso do apartamento do Guarujá ao conhecimento e julgamento do
juiz de Curitiba), restou desprovida de suporte fático por insuficiência de
prova idônea à evidência da veracidade dos fatos quanto a alegada
participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no projeto-evento designado aqui Sistema de Corrupção nas Licitações da Petrobras - SICLIP. As relações nesse mega evento se davam, diretamente, entre
empreiteiras de obras públicas e diretores da Petrobrás. Aparece, também, nos
eventos de corrupção da Petrobras, uma relação triangular entre agentes da Petrobras,
agentes das empreiteiras e dirigentes partidários, inclusive, aqui nesta
esfera, relevam pontos de contato entre Léo Pinheiro (OAS empreiteira) e João Vaccari
(tesoureiro do PT), por volta de 2006 ou 2007. Aí aparecem, provavelmente, as trilhas do caminho que levará ao
encontro dos dois agentes, em 2009.
Quando esses dois velhos conhecidos marcaram um jantar, em São Paulo, estavam impulsionados por interesses comuns, mas no espaço privado do mercado imobiliário. Tudo indica que aquela conversa Léo Pinheiro (diretor da OAS imobiliária) e João Vaccari (presidente a Bancoop) não teria pautado nenhum assunto relacionado com os interesses públicos do Governo e da Petrobras. Naquele restaurante, na verdade, está fincado o marco inicial do projeto-evento que distinguimos aqui como Transferência dos Empreendimentos da Bancoop para a OAS Imobiliária - TEBOI.
Quando esses dois velhos conhecidos marcaram um jantar, em São Paulo, estavam impulsionados por interesses comuns, mas no espaço privado do mercado imobiliário. Tudo indica que aquela conversa Léo Pinheiro (diretor da OAS imobiliária) e João Vaccari (presidente a Bancoop) não teria pautado nenhum assunto relacionado com os interesses públicos do Governo e da Petrobras. Naquele restaurante, na verdade, está fincado o marco inicial do projeto-evento que distinguimos aqui como Transferência dos Empreendimentos da Bancoop para a OAS Imobiliária - TEBOI.
Desta análise, assume-se que o único elo de ligação do projeto-evento SICLIP com o projeto-evento TEBOI está constituído por uma abstração, exatamente aquela construída como hipótese no Power Point do MPF e que foi ampliada pela mídia conservadora que a usou como mote para acusar Lula de ser o “chefe da maior organização criminosa de todos os tempos”.
Só por impulso do ódio que leva o senso comum a tratar Lula como inimigo e como bandido, pode-se aceitar o simplismo dessa lógica argumentativa construída pela narrativa da acusação. Afinal, que maluquice é essa? Como um presidente da República pode aparecer numa trama atuando no topo de um antigo mega sistema de corrupção, como o chefe todo poderoso de uma super máquina de enriquecer políticos e funcionários, e, ao mesmo tempo e sucessivamente, ser acusado de ter auferido - noutra trama e a título de vantagem indevida - uma merreca de apartamento numa praia cercada de esgotos? Um tríplex adaptado numa cooperativa habitacional construída para abrigar trabalhadores assalariados e sindicalizados?
E mais: a vantagem não estaria na circunstância de ter recebido ou aceitado a proposta de receber o valoroso tríplex. A vantagem indevida está definida como sendo a diferença apurada entre o valor pago por um apartamento simplex (141) e o valor final de outro apartamento reformado para funcionar como tríplex (164-A).
E de que circunstância fática ou jurídica teria nascido o direito de crédito relativamente a essa prestação compensatória?
Muito difícil precisar porque, pela dicção do voto do relator, a vantagem indevida consistiu na transferência da propriedade do tríplex ao Lula por meio de um ato informal: atribuiu-se ao ex-presidente "prerrogativas próprias de quem é proprietário", por meio de duas ações práticas: ¹ o imóvel foi excluído da comercialização com outras pessoas; ² foi atribuído a Lula a faculdade de determinar a realização de obras. Quem teria feito tais exclusão e atribuição de poderes não está esclarecido, bem como não há menção às circunstâncias históricas desses acontecimentos: onde, quando, como, por que meio, etc.
Pelo depoimento de Léo Pinheiro ao juízo criminal, a construção do tríplex e a subsequente reforma do ambiente interno do apartamento foram realizadas pela escolha livre de Léo Pinheiro, conforme está por ele próprio esclarecido nesta resposta que deu ao juízo durante o interrogatório:
“JM - Quem da OAS tratou desse assunto além senhor?
E mais: a vantagem não estaria na circunstância de ter recebido ou aceitado a proposta de receber o valoroso tríplex. A vantagem indevida está definida como sendo a diferença apurada entre o valor pago por um apartamento simplex (141) e o valor final de outro apartamento reformado para funcionar como tríplex (164-A).
E de que circunstância fática ou jurídica teria nascido o direito de crédito relativamente a essa prestação compensatória?
Muito difícil precisar porque, pela dicção do voto do relator, a vantagem indevida consistiu na transferência da propriedade do tríplex ao Lula por meio de um ato informal: atribuiu-se ao ex-presidente "prerrogativas próprias de quem é proprietário", por meio de duas ações práticas: ¹ o imóvel foi excluído da comercialização com outras pessoas; ² foi atribuído a Lula a faculdade de determinar a realização de obras. Quem teria feito tais exclusão e atribuição de poderes não está esclarecido, bem como não há menção às circunstâncias históricas desses acontecimentos: onde, quando, como, por que meio, etc.
Pelo depoimento de Léo Pinheiro ao juízo criminal, a construção do tríplex e a subsequente reforma do ambiente interno do apartamento foram realizadas pela escolha livre de Léo Pinheiro, conforme está por ele próprio esclarecido nesta resposta que deu ao juízo durante o interrogatório:
“JM - Quem da OAS tratou desse assunto além senhor?
LP - Do tríplex, quem tratou foi
eu. A empresa OAS empreendimentos só executou o que foi deliberado por mim.”
Se atentarmos
às provas apresentadas para elucidação do caso do tríplex da OAS imobiliária, constataremos
facilmente que nenhuma testemunha disse ter visto ou ouvido o ex-presidente
Lula solicitar, ordenar ou orientar o vendedor Léo Pinheiro a fazer reformas no
tríplex do condomínio Solaris. Pelo contrário. Há
testemunhos afirmando que o presidente Lula, durante e após a visita que fez ao
apartamento, apontou vários defeitos e objeções ao apartamento e, depois,
manifestou atitude clara de recusa à proposta de aderir ao condomínio.
O
fato de ter sido encontrado, muito tempo depois, na residência da família de
Lula um documento com termo de adesão em branco e este, depois, exibido no
processo com uma rasura, não indica e nem prova a existência de vontade para adquirir o
imóvel. Pelo contrário, demonstra indiferença ou recusa esse gesto de omissão
de Dona Marisa Letícia. O documento é um formulário que resultou do acordo entre Bancoop e OAS imobiliária. Ficou acordado a concessão de prazo para para os cooperados fazer opção entre aderir ao Solaris ou solicitar a devolução do dinheiro
pago pelo antigo apartamento que haviam adquirido da Bancoop.
Na trama do tríplex, então, a questão é esta. O ex-presidente Lula recebeu ou aceitou a oferta para adquirir o tríplex do Solaris? Onde? Quando? Como? De quem? E quem fez a reserva do tríplex para a família do presidente Lula? O próprio Lula ou Dona Marisa? O próprio Léo Pinheiro, por iniciava própria? O Léo Pinheiro, por orientação do João Vaccari? E quem orientou o João Vaccari? Onde? Quando? Como? Paulo Okamoto nega ter participado desse acerto. Nega ter dado qualquer orientação nesse sentido. O presidente Lula também nega ter praticado qualquer pedido ou orientação, a quem quer que seja. Esta é uma circunstância fática imprescindível à configuração do crime imputado a Lula da Silva.
Vamos à melhor parte.
Na trama do tríplex, então, a questão é esta. O ex-presidente Lula recebeu ou aceitou a oferta para adquirir o tríplex do Solaris? Onde? Quando? Como? De quem? E quem fez a reserva do tríplex para a família do presidente Lula? O próprio Lula ou Dona Marisa? O próprio Léo Pinheiro, por iniciava própria? O Léo Pinheiro, por orientação do João Vaccari? E quem orientou o João Vaccari?
Vamos à melhor parte.
Melhor
prosseguir conhecendo o texto de elevadíssima qualidade jurídica do juiz Silvio
Luís Ferreira da Rocha – Mestre e Doutor em Direito Civil pela PUCSP. Doutor e
Livre-Docente em Direito Administrativo pela PUCSP. Professor Assistente Doutor
da PUCSP. Juiz Federal Titular, da 10ª Vara Criminal em São Paulo – publicado
no site Justificando. Obs:
destaques e colorido feitos para a leitura trabalhada do autor deste blog.
“
O Juiz e a construção dos
fatos
Em distintos artigos,
procurei destacar a importância do papel do magistrado na efetivação e respeito dos direitos fundamentais, mesmo quando
diante do delicado tema da corrupção,
que desperta em diversos segmentos
sociais justos sentimentos de repulsa.
Chamei a atenção para o fato
de que um sistema eficiente de apuração
e responsabilização de atos de corrupção, desejado por todos nós, deveria:
a) ter exata noção da interdependência entre Estado e Mercado
e do quanto um sistema econômico
capitalista é propenso a incentivar e estimular atos de corrupção públicos e
privados;
b) não deslegitimar o Estado como instância apta a
regular os conflitos sociais e a reduzir
as desigualdades;
c) não tratar os atos de apuração e persecução da corrupção como
escândalos ou espetáculos;
d) não criminalizar a Política, nem procurar deslegitimá-la como a principal instância mediadora dos conflitos
sociais numa sociedade democrática;
e) não atuar de forma condescendente com os agentes econômicos
verdadeiramente responsáveis pela corrupção de agentes privados e públicos, mediante
a concessão de importantes benefícios penais e processuais pela mera delação de partícipes ou de crimes de menor
importância;
f) estabelecer e realizar uma qualificação rigorosa dos atos praticados e
evitar generalizações incompatíveis com o princípio da legalidade estrita,
que deve nortear a persecução penal em sociedades democráticas, e, com isso,
classificar como corrupção atos que não o seriam;
g) assegurar no contexto de um sistema democrático um julgamento justo a
todos os acusados.
Dentre a exigência de
assegurar-se, no contexto de um sistema democrático, um julgamento justo a todos os acusados, está o de condenar-se alguém, em especial no
âmbito penal, apenas quando estiver
certa a ocorrência de um crime e
comprovada por provas, isenta de qualquer dúvida razoável, a sua
autoria, coautoria ou participação. Isso suscita o delicado problema da fundamentação das sentenças.
É certo que prevalece o sistema de persuasão racional no qual o
juiz tem o dever de fundamentar sua
decisão, indicar os motivos e as circunstâncias que o levaram a admitir a veracidade dos fatos
em que baseou a decisão. Contudo, esse sistema de persuasão racional não se
contentaria, tão somente, com a produção de uma motivação clara e coerente, mas exigiria mais, como a existência
efetiva dos fatos confirmada
pela análise crítica de todas as
provas disponíveis. [1]
II.
Um caso que suscitou
controvérsia entre os profissionais da área jurídica foi o processo instaurado contra o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva,
conhecido como o caso do tríplex.
Basicamente, a controvérsia reside em
saber se as provas
produzidas nos autos justificariam
a condenação do ex-presidente.
O resumo da denúncia, localizado nos distintos itens abaixo, transcritos dela
própria, conforme disponibilizado em inúmeros sítios da internet, revela que ela trata de um suposto típico
caso de corrupção bilateral em que haveria
por parte de empresários a oferta ou
promessa de vantagens indevidas a funcionários públicos para determina-los a praticar, omitir ou retardar ato de ofício
(Corrupção ativa, art. 333 do CP) seguido da aceitação da promessa ou do recebimento das vantagens indevidas
pelos funcionários (corrupção passiva, art. 317 do CP).
De fato, narra a denúncia:
135. O que a evolução da investigação revelou, conforme descrito
anteriormente, é que, por trás de todo
esse esquema partidário distribuído entre diferentes Diretorias
e, mesmo, órgãos públicos federais, existia
um comando comum, Lula, que era simultaneamente chefe do governo beneficiado e líder de uma das principais legendas
envolvidas. Assim, Renato Duque e
Pedro Barusco agiram na execução de um comando central que orquestrou
a macrocorrupção que objetivava,
ilicitamente, enriquecer os envolvidos,
alcançar
governabilidade criminosa e perpetuar-se no
poder.
Os contratos que originaram as vantagens indevidas
136. Como exposto, as ofertas, promessas e recebimentos de
vantagens indevidas foram efetuados dentro de um amplo esquema criminoso que
se desenvolveu no seio e em desfavor da Administração Pública Federal, envolvendo a prática de crimes contra a
ordem econômica, corrupção, fraude a licitações e lavagem de dinheiro 246.
Nesse contexto, no que tange aos contratos de obras da PETROBRAS, a corrupção era
bilateral e envolvia não só a corrupção ativa, por parte dos executivos das empreiteiras cartelizadas,
como também, e de forma concomitante, a
corrupção passiva de agentes públicos, a fim de que estes zelassem, ilegalmente, no
âmbito da estatal e do próprio governo federal, pelos interesses das empresas cartelizadas e dos partidos políticos que representavam.
Para a presente denúncia, interessam
especificamente os atos de corrupção praticados em
detrimento da Administração Pública Federal, no âmbito de contratos relativos a três empreendimentos
da Petrobras:
(a) obras de "ISBL da Carteira de Gasolina e UGHE HDT de instáveis
da Carteira de Coque" da Refinaria Getúlio Vargas – REPAR;
(b) implantação das UHDT´s e UGH´s da Refinaria Abreu e Lima – RNEST;
(c) implantação das UDA´s da Refinaria Abreu e Lima – RNEST.
Nessas condutas delitivas, de um lado figuram
Léo Pinheiro e Agenor Medeiros,
executivos do Grupo OAS, participante do conjunto de empreiteiras cartelizadas
e, de outro, Lula, Renato Duque, Pedro
Barusco e Paulo Roberto Costa.
Nessa senda, Léo
Pinheiro e Agenor Medeiros,
executivos do Grupo OAS, integrante
do Consórcio Conpar, ofereceram e
prometeram vantagens indevidas a Renato Duque, Pedro Barusco, e Paulo
Roberto Costa262, funcionários de alto escalão da Petrobras, bem como a Lula, que se
beneficiava e agia para a manutenção do esquema e a permanência desses diretores nos respectivos cargos.
As ofertas e promessas
objetivavam também que os funcionários públicos se omitissem nos deveres que decorriam de
seu ofício e permitissem que a escolha interna do cartel para a execução da obra se concretizasse.
Todo o procedimento de negociação
para a contratação direta do Consórcio
Conpar foi comandado
pelo então Gerente Executivo de Engenharia, Pedro
Barusco263, então subordinado de Renato Duque264, em procedimento
também submetido ao Diretor de
Abastecimento, Paulo
Roberto Costa.
Acerca da bilateralidade (promessa
seguida de aceitação ou oferta seguida de recebimento) diga-se, de
passagem, que ela não é requisito em
nosso ordenamento jurídico para a caracterização do crime de corrupção,
porque o ordenamento jurídico
disciplinou os crimes de corrupção ativa e o de corrupção passiva em tipos
penais distintos e autônomos, de modo que a comprovação de um deles não pressupõe a
do outro.
No entanto, no caso ora
citado, o próprio órgão de acusação afirmou a existência da
bilateralidade na corrupção e,
com isso, restou
vinculado ao alegado na inicial acusatória, o que significa que ¹ teria havido a promessa de vantagens por
agentes privados
²aceita por agentes públicos em troca da prática de atos de ofício.
Os sujeitos centrais do crime de corrupção,
segundo a denúncia, além dos empresários
seriam Luís Inácio Lula da Silva, citado
como o suposto comandante, Renato Duque, Pedro Brausco e Paulo Roberto
Costa, os executores de suas ordens.
Narra a denúncia:
135. O que a evolução da investigação revelou, conforme descrito
anteriormente, é que, por trás de todo esse esquema partidário
distribuído entre diferentes Diretorias e, mesmo, órgãos públicos federais,
existia um comando comum, Lula, que
era simultaneamente chefe do governo
beneficiado e líder de uma das principais legendas envolvidas. Assim,
Renato Duque e Pedro Barusco agiram na
execução de um comando central que orquestrou a macrocorrupção que objetivava,
ilicitamente, enriquecer os envolvidos, alcançar
governabilidade criminosa e perpetuar-se no poder.
Assim, a condenação dos réus, inclusive
a do ex-presidente Luís Inácio Lula
da Silva, exigiria, além da prova
da ocorrência dos crimes, a comprovação, para além de qualquer dúvida razoável,
da autoria
ou coautoria nos respectivos crimes, consubstanciada na designação de
ordens e instruções aos executores, bem como na aceitação ou recebimento das vantagens oferecidas ou
entregues.
Como dito, além de Luís Inácio Lula da Silva a
denúncia implicou Renato Duque, Pedro Barusco, Paulo Roberto Costa,
como agentes públicos. Os últimos, no entanto, fizeram acordo de colaboração premiada,
o que criou para eles, entre outras obrigações, a
de dizer a verdade e a de cooperar na instrução probatória.
Em juízo foram ouvidos Paulo Roberto Costa e Pedro Barusco, apontados como executores, que, no
entanto, ao
depor inocentaram ou pelo menos não incriminaram o ex-Presidente
Luiz Inácio Lula da Silva.
Paulo Roberto Costa disse que não tinha intimidade com o ex-presidente. As vezes que o
encontrou foi para discutir projetos específicos da empresa e negou ter o
conhecimento de solicitação ou pagamento de vantagem indevida pelo ou ao
ex-presidente.
De acordo com a sentença,
item 744:
744. Paulo Roberto Costa, Diretor de Abastecimento da Petrobrás entre 2004 e 2012, também celebrou acordo de colaboração e que foi homologado pelo
Egrégio Supremo Tribunal Federal. Já foi
condenado em diversas ações penais perante este Juízo por crimes de corrupção e
lavagem de dinheiro (cópia das sentenças no evento 847). Prestou depoimento em Juízo como testemunha
(evento 394).
745. Em seu depoimento em Juízo, confirmou o esquema criminoso sintetizado pelo Juízo nos
itens 266-274, retro, com recebimento
de vantagem indevida em contratos da Petrobrás com grandes empreiteiras
e a repartição dela entre ele e agentes políticos do Partido Progressista. Também
declarou que teve
conhecimento de que propinas também eram
pagas para a Diretoria de Serviços e Engenharia da Petrobrás, desta
feita com direcionamento de parte para o Partido
dos Trabalhadores.
746. As propinas eram calculadas nos percentuais
de 1% a 3% sobre o valor dos contratos ("Não,
como eu já mencionei, para o PP era 1% para o PT, às vezes 2%, 1%, dependendo
do valor que era dado na licitação, às vezes o PP recebia menos de 1%").
747. Confirmou ter recebido vantagem indevida da Construtora OAS, inclusive
nos contratos relativos à Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e à
Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), e que teria tratado inclusive desta questão com
os acusados Agenor Franklin Magalhães Medeiros e José
Adelmário Pinheiro Filho (Léo Pinheiro)
748. Admitiu ter conhecido o
então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e tratado, em reuniões com ele, de
assuntos da Petrobrás.
"Assistente de
Acusação: – Rapidamente, excelência, são poucas perguntas. Qual era a relação
da testemunha com o ex-presidente Lula?
Paulo Costa: – Bom, o presidente Lula era o representante maior
aí do país, tivemos algumas reuniões em Brasília sempre acompanhado do
presidente da Petrobras ou da diretoria toda, quando tinha algum projeto
específico que ele mostrava interesse
para desenvolvimento de estado e etc., eu fui algumas vezes lá em Brasília,
inicialmente com o presidente José Eduardo Dutra, que já faleceu, e depois também tive algumas reuniões com a
participação do José Sergio Gabrielli junto com o presidente Lula, então eram assuntos da corporação que ele tinha
interesse de ver em alguns estados, para desenvolvimento dos estados.
Assistente de Acusação: –
Existem algumas testemunhas, e mesmo a imprensa fala que o presidente Lula chamava o senhor de Paulinho, qual era a sua relação
com ele, era próxima, não era, por que ele tinha esse apelido carinhoso para o
senhor?
Paulo Costa: – Eu nunca tive
intimidade com o presidente da república, o presidente Lula, eu não me recordo,
posso dizer, afirmar que não existiu de ele usar esse termo em relação a mim
diretamente, se ele usou com terceiros aí eu não posso dizer, mas eu pessoalmente, primeiro que eu nunca tive nenhuma reunião
eu só com o presidente Lula, como falei sempre tive reuniões com participação
do presidente da Petrobras ou da diretoria da Petrobras, e eu não tinha intimidade com o presidente Lula,
mas se ele chamava de Paulinho na frente de outros eu não posso lhe dizer, não
tenho esse conhecimento."
749. Negou ter conhecimento, porém, de
solicitação ou pagamento de vantagem indevida ao então Presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. (g.n).
Pedro José Barusco Filho, por sua vez, não teve contato com o ex-presidente.
De acordo com a sentença,
itens 750 e seguintes:
750. Pedro José Barusco Filho, gerente executivo da Área de Serviços e
Engenharia da Petrobrás entre 2003 e 2011, também
celebrou acordo de colaboração e que foi homologado por este Juízo. Já foi
condenado em diversas ações penais perante este Juízo por crimes de corrupção e
lavagem de dinheiro (cópia das sentenças no evento 847). Prestou depoimento em
Juízo como testemunha (evento 394).
751. Em seu depoimento em
Juízo, confirmou o esquema
criminoso sintetizado pelo Juízo nos itens 266-274, retro, com recebimento
de vantagem indevida em contratos da Petrobrás com grandes empreiteiras e a
repartição dela entre ele, o Diretor Renato de Souza Duque e agentes políticos
do Partido dos Trabalhadores ou
para o
próprio partido representado por João
Vaccari Neto. Também declarou que teve conhecimento de que propinas também eram pagas para a Diretoria de
Abastecimento da Petrobrás.
752. As propinas eram calculadas nos percentuais de 1% a 2%
sobre o valor dos contratos:
"Ministério Público
Federal:- E quando havia essa cobrança
de propina, qual era o percentual que incidia?
Pedro Barusco:- Bom, aí já começa a detalhar, mas, por exemplo,
porque a Petrobras tem três áreas de negócios, gás e energia, exploração e
produção, chamada EP, e a área de abastecimento, cujo diretor era o diretor
Paulo
Roberto Costa na época, então quando a diretoria de serviços trabalhava em
contratos para a área de abastecimento a propina era normalmente ou quase
sempre 2%, até onde eu sabia, até
onde eu saiba era 2%, 1% era encaminhado
para o diretor Paulo Roberto Costa, e ele
que dava andamento a esse 1%, dizia como era a distribuição, e outro 1% vinha
para a área de serviços, e aí quem dava, vamos dizer, quem orientava como
deveria ser dividido era o diretor Duque, e normalmente esse 1% que
vinha para a área de serviços metade era para o partido dos trabalhadores e
metade ficava para quem a gente chamava "casa", que
normalmente era
o doutor Duque e eu mesmo. Quando os contratos eram para a área de outros diretores, como gás e energia,
EP e às vezes através da própria área de serviços, esse percentual de 2% era
totalmente, vamos dizer, gerenciado pelo diretor Duque, aí era 1% para o PT e 1%
para a casa."
753. Confirmou ter recebido vantagem indevida da
Construtora OAS, inclusive nos contratos
relativos à Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR). Afirmou ter havido acerto de propina nos contratos
da Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), mas que saiu da empresa antes de recebê-la. Declarou que tratava de
propina com o acusado Agenor Franklin Magalhães Medeiros e que tinha conhecimento
de que João Vaccari Neto tratava a parte do
partido com José Adelmário Pinheiro Filho:
"Ministério Público
Federal: – Especificamente no caso da
empresa OAS, o senhor se recorda quem eram os executivos que tratavam de
propina?
Pedro Barusco: – É, agora então tem
que separar um pouco, tinha empresas cujo
agente que tratava, vamos dizer, comigo também tratava com o partido, e
tinham empresas que o agente que tratava
comigo era diferente e quem tratava com o partido era outro agente, a OAS, eu tratava com o senhor Agenor Medeiros,
e acredito que o, porque eu não tenho
certeza, não sabia exatamente como,
que o João Vaccari tratasse
com o senhor Léo Pinheiro direto.
Ministério Público
Federal: – Mas esse 'acredito' do senhor é baseado em que?
Pedro Barusco: – Em conversas, em...
Ministério Público
Federal:- Alguém relatou para o senhor,
o que aconteceu para o senhor acreditar
nisso?
Pedro Barusco: – Não, porque o
Vaccari conversava com os donos das empresas, ele tinha normalmente dentro do escalão das empresas uma
interlocução um pouquinho superior à minha.
Ministério Público Federal:
– Certo. Bom, essa denúncia trata de
três contratos, eu gostaria de saber se o senhor negociou propina nesses
contratos, HDT – carteira coque da Repar, consórcio Compar formado por OAS
e Odebrecht, consta daquela...
Pedro Barusco: – Eu acho que
teve combinação sim, esse é o típico contrato em que havia combinação.
Ministério Público
Federal: – Eu vou fazendo outra pergunta aqui enquanto pego a planilha e mostro
a planilha com as três. UHDT e UGH da Rnest?
Pedro Barusco: – Esse teve combinação, mas eu acabei não
recebendo porque quando começou a implementar eu logo depois saí da Petrobras.
Ministério Público
Federal: – Mas houve o acerto?
Pedro Barusco: – Houve.
Ministério Público
Federal: – Certo. UDA da Rnest.
Pedro Barusco:- Também
houve acerto, UDA."
Outras testemunhas também prestaram depoimento. Elas também não incriminaram o ex-presidente Luís Inácio
Lula da Silva.
Uma delas bastante conhecida,
o doleiro Alberto Youssef. Consta da
sentença:
759. Alberto Youssef também prestou depoimento em Juízo (evento 417).
Também ele
celebrou acordo de colaboração homologado
pelo Supremo Tribunal Federal. Em seu depoimento, declarou que intermediava o pagamento de vantagem indevida entre as empreiteiras e o Diretor de Abastecimento
da Petrobrás Paulo Roberto Costa e
também para
agentes políticos do Partido Progressista. Também confirmou os ajustes fraudulentos de licitação entre empreiteiras fornecedoras da
Petrobrás.
760. Também ele já foi condenado por corrupção e lavagem
por este Juízo (cópia das sentenças no evento 847).
761. A propina era em regra fixada em 1% do valor
do contrato. A OAS participava dos
ajustes de licitação e também do
pagamento da propina. A testemunha tratava
com Agenor Franklin Magalhães Medeiros pela
OAS. Declarou
ter conhecimento de que também havia pagamento de propina à
Diretoria de Serviços e Engenharia da Petrobrás e que parte dos valores eram destinados ao
Partido dos Trabalhadores.
762. Confirmou ainda o pagamento de propinas nos
contratos mencionados na denúncia, envolvendo a Refinaria Presidente
Getúlio Vargas (REPAR) e a Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST).
763. Confirmou que utilizou as empresas de fachada MO
Consultoria e Empreiteira Rigidez para receber e repassar os recursos de
propinas, inclusive nesses contratos.
764. Declarou não ter
conhecimento de solicitação ou pagamento de vantagem indevida ao ex-Presidente
da República Luiz Inácio Lula da Silva.
Milton Pascowitch, que de acordo com a acusação era o responsável pela intermediação
de pagamentos de vantagens indevidas entre
fornecedores da Petrobras e agentes da
Área de Serviços e Engenharia da Petrobrás, Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco
de Oliveira, também prestou
depoimento.
Consta do item 770 da sentença:
770. Milton Pascowitch também prestou depoimento em
Juízo (evento 417). Antes, celebrou acordo de colaboração com o MPF e que foi
homologado pelo Juízo. Em seu depoimento, declarou
que intermediava o pagamento de vantagem indevida entre fornecedoras da
Petrobras e agentes da Área de Serviços e Engenharia da Petrobrás, Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho,
bem como para agentes do Partido dos Trabalhadores,
entre eles o ex-Ministro Chefe da Casa Civil José Dirceu de Oliveira e Silva. As propinas eram calculadas em 1% sobre o
valor do contrato e divididas entre os agentes da Petrobrás e os agentes
políticos. Milton
Pascowitch, assim como José Dirceu de Oliveira e Silva, foram condenados
por crimes de corrupção e lavagem na ação penal 5045241-84.2015.4.04.7000,
com cópia da sentença no evento 847. Afirmou não ter conhecimento da participação do
ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (g.n).
Foram ouvidos, ainda Delcídio do Amaral Gomes, Augusto
Ribeiro de Mendonça Neto, Eduardo Hermelino Leite, Dalton dos Santos Avancini e
todos não
incriminaram o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva.
Delcídio do Amaral Gomes.
729. Delcídio do Amaral
Gomez, Senador da República, ao tempo dos fatos, celebrou acordo de colaboração
que foi homologado pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal. Em Juízo (evento
388), declarou, em síntese, que havia uma distribuição de cargos pelo Governo
Federal no âmbito da Administração Pública Federal direta ou indireta. Tal
distribuição abrangia a Petrobrás. Segundo a testemunha, os indicados aos cargos na Petrobrás tinham
uma obrigação de arrecadar propina para os partidos políticos, o que era do conhecimento, embora não em detalhes, do então Presidente da República Luiz Inácio Lula da
Silva. Apesar das afirmações do ex-Senador, ele
também declarou que não chegou a tratar diretamente
deste assunto com o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva pois "não
tinha essa relação próxima com o presidente
para ter esse tipo de diálogo com ele" (g.n).
Augusto Ribeiro de Mendonça
Neto.
730. Augusto Ribeiro de
Mendonça Neto, gestor das empresas que compunham o Grupo Setal ao tempo dos
fatos, também prestou depoimento em Juízo (evento 388). Também ele celebrou
acordo de colaboração e que foi homologado por este Juízo. Foi ele condenado
por crimes de corrupção e lavagem na ação penal 5012331-04.2015.4.04.7000, pelo pagamento de vantagem indevida e
ocultação e dissimulação de produto do crime, em contratos com a Petrobrás nos
Consórcios Interpar e CMMS envolvendo obras na Refinaria Presidente Getúlio
Vargas (REPAR) e na Refinaria de Paulínia (REPLAN), com cópia da sentença no
evento 847.
731. O dirigente do Grupo Setal negou, porém,
ter conhecimento de solicitação ou pagamento de vantagem indevida ao então
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. (g.n).
Eduardo Hermelino Leite e
Dalton dos Santos Avancini, executivos da Camargo Corrêa:
737. Eduardo Hermelino Leite, Diretor de Óleo e Gás da Camargo Correa,
na época dos fatos, e em situação similiar a Dalton dos Santos Avancini, com
acordo de colaboração e condenação criminal na ação penal 508325829.2014.4.04.7000,
confirmou, em síntese, os mesmos fatos
por ele, Dalton dos Santos Avancini, declarados em Juízo, ou seja, os acertos
fraudulentos de licitação e os pagamentos de vantagens indevidas em contratos
da Petrobrás aos agentes da Petrobrás e a destinação parcial delas aos partidos
políticos (evento 388).
738. Nenhum dos executivos da Camargo Correa
afirmou, porém, ter conhecimento de solicitação ou pagamento de vantagem
indevida ao então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (g.n).
Os empresários e executivos José Adelmário Pinheiro
Filho, Presidente da OAS, e Agenor Franklin Magalhaes Medeiros, admitiram os
crimes de corrupção ativa e passiva,
mas
indicaram o ajuste com pessoa diversa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva.
Consta da sentença nos itens
771 e seguintes:
774. Também, como já adiantado nos itens 516-537 e 568-578, José
Adelmário Pinheiro Filho, Presidente da OAS, e Agenor Franklin Magalhães
Medeiros, reconheceram a existência do
esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, os ajustes fraudulentos de licitação e o pagamento de vantagem indevida em contratos com a Petrobrás para agentes da Petrobrás, agentes políticos e partidos políticos.
775. Também reconheceram especificamente o pagamento de
vantagem indevida nos contratos da Petrobrás com o Consórcio CONPAR e no
Consórcio RNEST/CONEST nas obras da Refinaria Presidente Getúlio Vargas
(REPAR) e Refinaria do Nordeste Abreu
e Lima (RNEST).
776. Para ser mais
preciso, José
Adelmário Pinheiro Filho declarou não se recordar especificamente dos acertos
na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), mas que, quanto ao
contrato na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), foi procurado
diretamente por João Vaccari Neto para o pagamento de 1% sobre o valor do
contrato ao Partido dos Trabalhadores ("Eu
fui procurado pelo senhor João Vaccari e ele me falou que tinha um pagamento de
1% para o PT, isso foi diretamente comigo").
777. Agenor Franklin Magalhães Medeiros,
encarregado especificamente dos contratos da Construtora OAS com a Petrobrás, confirmou que
José Adelmário Pinheiro Filho interferiu
junto ao Goveno Federal para que a OAS
passasse, ao final de 2006, a ser convidada para grandes obras na estatal.
Também declarou que os contratos
envolviam pagamento de propinas de 2% a agentes públicos e agentes políticos e que os contratos na
Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e na Refinaria do Nordeste Abreu e
Lima (RNEST) foram obtidos mediante
ajuste fraudulento de licitação.
778. Declarou que no contrato da CONPAR, na Refinaria Presidente Getúlio
Vargas (REPAR), a vantagem indevida aos agentes públicos e políticos ficou
a cargo da Odebrecht e da UTC Engenharia, desconhecendo o depoente os detalhes
de como isso foi feito.
779. No caso dos contratos da CONEST/RNEST, na Refinaria do Nordeste
Abreu e Lima (RNEST), confirmou que houve ajuste de 2% de propinas sobre o valor
dos dois contratos, que elas se destinavam aos agentes da Petrobrás e aos
agentes políticos e que parte dos valores foram pagos pela Odebrecht e parte
pela OAS.
780. Do total das propinas, dezesseis milhões de
reais foram destinados ao Partido dos Trabalhadores, através de João Vaccari Neto ("Aí é onde está, 13 milhões e meio mais 6 milhões e meio
totalizam 20, para os 36 sobraram 16 milhões
para o PT, e assim foi feito, Léo
esteve em contato com João Vaccari e ficou
decidido que 16 milhões de reais, por conta da nossa parte na Rnest, seriam
para o PT").
Se nenhum dos empresários ou agentes públicos direta
ou indiretamente envolvidos na narrativa dos fatos incriminou o ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, pelo menos no curso da instrução teria sido identificada a prática de ato funcional
do ex-presidente, derivado de sua
competência e objeto da promessa indevida?
A pergunta é pertinente por que a Jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça exige que nos crimes de
corrupção passiva haja o
indispensável nexo de causalidade entre a conduta do servidor e
a realização do ato funcional de sua competência, conforme tese
consolidada em Jurisprudência em Teses, edição nº 57,verbis:
17.Nos crimes de corrupção
passiva é indispensável haver nexo de causalidade entre a conduta do servidor e
a realização do ato funcional de sua competência. Acórdãos AgRg no REsp
1519531/SP,Rel. Ministro Sebastião Reis Junior, Sexta turma, Julgado em
23/06/2015,DJE 03/08/2015. HC 135142/MS,Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta
Turma, Julgado em 10/08/2010,REPDJE01/08/2011.HC 123234/SP,Rel. Ministra
LAURITA VAZ, QUINTA TURMA,Julgado em 22/06/2010,DJE02/08/2010.APn
000224/SP,Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, CORTE ESPECIAL, Julgado em
01/10/2008,DJE23/10/2008.REsp 440106/RJ,Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA
TURMA,Julgado em 24/02/2005,DJ09/10/2006.REsp 825340/MG,Rel. Ministro Feliz
Fischer, Quinta Turma, Julgado em 17/08/2006,DJ 25/09/2006.
Nesse sentido também decidiu
o Supremo Tribunal Federal, em emblemático precedente, ao determinar que "para
a configuração da corrupção passiva deve ser apontado ato de ofício do
funcionário, configurador de transação ou comércio com o cargo então por ele
exercido " (Ação Penal 307/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ilmar
Galvão, Tribunal Pleno, DJ de 13/10/1995).
De acordo com o referido
julgado, para verificar-se o crime de
corrupção passiva, não basta que a
solicitação, recebimento ou aceitação da promessa se faça pelo funcionário público em razão do exercício da função,
ainda que fora dela, ou antes de seu início. Indispensável se torna a existência de
nexo de causalidade entre a conduta do
funcionário e a realização de ato funcional de
sua competência.
É, com efeito, de Nelson
Hungria a lição de que:
"a corrupção (corruption, bribery, Bestechung, coecho, corruzione), no seu tipo central, é a venalidade
em torno da função pública, denominando-se passiva quando se tem em vista a conduta do
funcionário corrompido, e ativa quando
se considera a atuação do corruptor" (Comentários, vol. IX, p.365).
Por essa razão que Heleno
Fragoso (Lições de Direito Penal, Vol. II, forense, 1980, p.438) sustenta que o crime de corrupção passiva está na
perspectiva de um ato de ofício que à acusação cabe apontar na denúncia e demonstrar no curso do processo, sendo indispensável
que o agente tenha consciência de que recebe ou aceita retribuição por um
ato funcional que já praticou ou deve praticar.
E por ato de ofício, consoante uniforme jurisprudência, se entende
somente aquele pertinente à função específica do funcionário. É a lição
de Nélson Hungria, obra citada, pág. 371:
"O ato ou abstenção a que se
refere deve ser da competência do intraneus, isto é, deve
estar compreendido nas suas específicas atribuições funcionais, pois só
neste caso pode deparar-se com um dano efetivo ou potencial ao regular
funcionamento da administração".
Assim, para a configuração do
crime do art. 317, do Código Penal, a atividade visada pelo suborno há de encontrar-se
abrangida nas atribuições ou na competência do funcionário que a realizou ou se
comprometeu a realiza-la, ou que, ao menos, se encontre numa relação funcional imediata com o desempenho do
respectivo cargo, assim acontecendo sempre que a
realização do ato subornado caiba no âmbito dos poderes inerentes ao exercício
do cargo do agente.
Contudo, a instrução probatória não o encontrou; E parece que a sentença reconheceu isso ao recorrer ao instituto do
ato de ofício indeterminado, figura admitida no Direito norte-americano, o
que, do ponto de vista jurídico, salvo melhor juízo, nenhuma utilidade teria como argumento válido para fundamentar uma
condenação, porque em Direito penal
proíbe-se o recurso a analogia e
outras formas de integração para
fundamentar um juízo condenatório contra o acusado.
Consta da sentença:
862. Há crime de corrupção se há pagamento de vantagem indevida a agente
público em razão do cargo por ele ocupado.
863. A efetiva prática de ato de ofício ilegal é causa de aumento de pena,
mas não é exigido para a tipificação dos crimes dos arts. 317 e 333 do CP.
864. Assim, uma empresa não pode realizar pagamentos a
agentes públicos, quer ela tenha ou não presente uma contrapartida específica
naquele momento.
865. Basta para a configuração que os pagamentos sejam realizadas em razão
do cargo ainda que em troca de atos de ofício indeterminados, a serem praticados assim que as oportunidades
apareçam. Citando Direito Comparado, "é suficiente que o agente público entenda que dele ou dela era esperado
que exercitasse alguma influência em favor do pagador assim que as
oportunidades surgissem" ("US v. DiMasi", nº 11-2163, 1st
Cir. 2013, no mesmo sentido, v.g., "US v. Abbey", 6th Cir. 2009,
"US v. Terry", 6th Cir. 2013, "US v. Jefferson", 4th Cir.
2012, todos de Cortes de Apelação Federais dos Estados Unidos)(g.n).
De acordo com a denúncia a vantagem supostamente auferida por Luis
Inácio Lula da Silva seria constituída pela
diferença de preço entre a unidade simples e o apartamento tríplex,
bem como os custos
da reforma do apartamento.
Conforme narrado na sentença,
a solicitação dessa vantagem teria
ocorrido em maio ou junho de 2014, quando José Adelmário Pinheiro Filho teria
se encontrado com João Vaccari
Neto e acertado que a diferença de
preço entre a unidade simples e o apartamento tríplex seriam abatidos da
mencionada conta geral de propinas que o Grupo OAS tinha com o Partido dos Trabalhadores:
José Adelmário Pinheiro
Filho ainda declarou que encontrou-se com João Vaccari Neto em maio ou junho de
2014 e restou acertado com ele que a diferença de preço entre a unidade simples
e o apartamento triplex, bem como os custos da reforma do apartamento e
igualmente do Sítio em Atibaia, seriam abatidos da mencionada conta geral de
propinas que o Grupo OAS tinha com o Partido dos Trabalhadores. João Vaccari
Neto confirmou essa possibilidade somente em um segundo encontro com José
Adelmário Pinheiro Filho. Também seriam abatidos outros custos de
empreendimentos do BANCOOP, passivos ocultos – segundo ele, que foram assumidos
pela OAS. Transcreve-se:
"José Adelmário
Pinheiro Filho: – Em maio ou Junho de 2014, com os custos já de todos os
empreendimentos Bancoop já bem aferidos e também toda a especificação, tudo que
ia ser feito tanto no sítio como no triplex, eu procurei o João Vaccari e disse
a ele 'Olhe, estou com os elementos todos em mãos e queria discutir', ele
marcou, ele disse 'Olhe, o clima entre a sua empresa e o Bancoop não está bom,
eu vou sugerir a gente fazer um jantar, eu vou chamar a diretoria do Bancoop,
você chama o pessoal seu, e vamos sentar antes, então ele marcou comigo no
mesmo local, no restaurante, um encontro com ele, onde eu levei esses créditos
e esses débitos, eu levei para ele o que nós, OAS, estava devendo por conta
desses pagamentos de vantagens indevidas ao PT naquele momento, o que já estava
atrasado e o que ainda ia acontecer, e os custos dos empreendimentos que nós
estávamos fazendo, desses passivos, que eu estou chamando de passivos ocultos, o termo usado de coisas que nós não tínhamos
conhecimento, e mais os custos do
triplex e do sítio, o João Vaccari disse 'Olhe, está tudo ok, está dentro
de um princípio que nós sempre adotamos, porque sempre, de quando em quando,
que abria um encontro de contas com ele tinha 'Não, você paga isso ao diretório
tal, paga isso ao político tal', isso era feito e era uma coisa já corriqueira,
então 'Não vamos mudar a metodologia, vamos continuar com a metodologia, agora
como tem coisas aqui de cunho pessoal, que trata do presidente, eu vou
conversar com ele sobre isso e lhe retorno. Agora nesse encontro que nós vamos
ter com a diretoria do Bancoop e com o seu pessoal eu gostaria que você não
tratasse desse encontro de contas, eu queria que a empresa desse uma
tranquilizada na diretoria do Bancoop que os empreendimentos iam prosseguir,
que não haveria nenhuma solução de continuidade', e assim foi feito, houve
isso. Passaram alguns dias, talvez uma semana ou duas no máximo, o Vaccari me
retornou dizendo que estava tudo ok, que poderíamos adotar o sistema de
encontro de contas entre créditos e débitos que nós tínhamos com ele.
Cabe o registro que aqui o suposto
acerto não se deu diretamente com o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva,
mas com terceiro, em data definida como
maio ou junho de 2014, distante, portanto,
das datas das assinaturas dos contratos que
teriam originado o pagamento das vantagens indevidas (31.08.2007,
10.12.2009 ou últimos aditivos 28.12.11, 23.01.12) e quando Luís Inácio Lula da Silva já não
era mais Presidente da República, pois deixou o cargo em 31.12.10 e não mais ostentava a condição de agente
político e, assim, em tese, não poderia ser o sujeito ativo do crime
de corrupção passiva, que pressupõe a investidura
em função pública.
III.
Como dito, a atividade do juiz é pautada pela persuasão
racional ou livre convencimento motivado. Contudo, esse sistema de persuasão racional não se contenta, tão somente, com a produção de uma motivação congruente
e coerente, mas, em especial, com a existência efetiva de fatos, confirmada pela análise crítica de todas as
provas disponíveis. A narrativa apresenta-se como verídica quando seus
enunciados componentes encontram nas provas grau
adequado de confirmação.[2]
É a distinção entre verdade e certeza. A verdade é
objetiva e determinada pela realidade
dos fatos de que se fala. A certeza é um status subjetivo, que
corresponde a um grau elevado de
intensidade do convencimento do sujeito. [3]
Um processo judicial penal democrático e
substancialmente justo, aplicável a
todos, não se contenta com a certeza,
mas requer e exige verdade. A verdade, no entanto, é difícil de obter-se; por isso não é tarefa
fácil condenar alguém.
A partir da concepção democrática de um julgamento
justo, preocupada em exigir uma
narrativa verídica como fundamento para a condenação, o magistrado imparcial e independente
deve sempre perguntar se as provas
apuradas no processo instaurado contra qualquer réu realmente levaram a considera-lo culpado dos crimes pelos quais foi
acusado?
A pergunta ganha maior densidade no caso do ex-presidente
Luis Inácio Lula da Silva porque sua
condenação pode afastá-lo da corrida
presidencial e, com isso, ao invés
de um, ele teria dois direitos
fundamentais violados: a liberdade
e o direito de participar da vida
política.
Tire o leitor as suas próprias conclusões.
Silvio Luís Ferreira da
Rocha é Mestre e Doutor
em Direito Civil pela PUCSP. Doutor e Livre-Docente em Direito Administrativo
pela PUCSP. Professor Assistente Doutor da PUCSP. Juiz Federal Titular da 10ª
Vara Criminal em São Paulo.
[1] Michelle Taruffo, Uma
simples verdade: O Juiz e a construção dos fatos, p.278.
[2] Michelle Taruffo, Uma
simples verdade: O Juiz e a construção dos fatos, p.278.
[3] Michelle Taruffo, Uma simples verdade: O Juiz e a construção dos fatos,
p.108.
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